Comunidade do Aventureiro

Uma longa parceria

A presença de uma comunidade caiçara com domínio sobre a praia, como ocorre no Aventureiro, na Ilha Grande, somente foi possível em função da Reserva Estadual Biológica da Praia do Sul (ReBio Praia do Sul), em 1981. O estopim para criação da ReBio Praia do Sul foi a abertura de uma estrada que ligava a praia da Longa (na face abrigada da ilha) com a praia do Sul para a implantação de um complexo turístico. A Reserva resguardou da ação do capital os anfiteatros das praias do sul e do leste, além das praias do Demo e do Aventureiro, localizadas nessa enseada, protegendo um importante ecossistema composto por restinga, lagoa e mangue.

Indiretamente, por muito tempo a ReBio Praia do Sul acabou preservando a própria comunidade do Aventureiro da especulação imobiliária. Por outro lado, criminalizou a comunidade do Aventureiro, que de uma hora para outra, se viu morando dentro de uma categoria de Unidade de Conservação (UC) das mais restritivas do SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação). As Reservas Biológicas tem como objetivo a preservação integral da biota e demais atributos naturais, sem interferências humanas. Assim, como a visitação pública é proibida, a presença de moradores em seu interior é considerada ilegal. Criando-se uma situação de ilegalidade para a comunidade que ali vivia, segundo relatos orais, há mais de 150 anos.

O então órgão gestor da UC, a extinta FEEMA (Fundação Estadual de Engenharia de Meio Ambiente), em 1982, tinha a intenção de reassentar a comunidade em Angra dos Reis. Mas, em 1985, o plano de manejo da unidade propunha “redelimitar” a reserva e manter a comunidade do Aventureiro em seu território, entretanto tal documento não chegou a ser oficializado. A comunidade permaneceu em seu território e a sua relação com o ambiente passou a ser regulada e fiscalizada pela FEEMA.

A partir de meados da década de 1990, após a implosão do Instituto Penal Cândido Mendes e o incremento da atividade turística na Ilha Grande, a praia do Aventureiro passa a ser um destino cada vez mais buscado por surfistas, trilheiros e interessados no turismo de camping. Aos poucos a comunidade se organizou para essa nova atividade econômica que passou a substituir, para algumas famílias, o trabalho na pesca embarcada como principal sustento. 



O turismo passou a ser mais um elemento de conflito entre a comunidade e a FEEMA. No ano 2000 um inquérito civil solicita o remanejamento da comunidade do Aventureiro para o continente alegando que, com a chegada do turismo, a comunidade  teria abandonado seu modo de vida tradicional. A partir de então, a comunidade cria a Associação de Moradores e Amigos e do Aventureiro, a AMAV. No carnaval de 2006, com a operação “Angra Legal”, o turismo na praia do Aventureiro foi oficialmente proibido através de uma espetaculosa operação da polícia florestal.

Nesse momento, a SAPÊ, cujos membros já frequentavam a comunidade, acolheu as demandas da mesma  e acionou o Ministério Público Estadual defendendo seu direito ao território. Depois de muitas reuniões e articulações, foi assinado um Termo de Compromisso entre a FEEMA, Prefeitura e AMAV com o Ministério Público Estadual, em dezembro de 2006. Esse termo estabeleceu normas e limites para o turismo no local e determinou a criação de uma nova unidade de conservação compatível com a permanência da comunidade.

Em 2008 iniciou-se o  processo de recategorização da praia do Aventureiro que culminou com a criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Aventureiro, com a Lei Estadual nº 6.793/2014. Foi um processo longo e desgastante para a comunidade, marcado por muitas divisões internas. 

A SAPÊ apoiou a criação da RDS por entender que essa categoria de UC seria a mais adequada para a preservação ambiental e a permanência da comunidade. A outra opção defendida seria a Área de Proteção Ambiental (APA) na qual a venda de terras é permitida. Considerando a existência de escrituras da área na mão de estrangeiros e o altíssimo interesse imobiliário na Ilha Grande e, sobretudo, no Aventureiro, temos a clareza de que a pressão pela venda de terras iria se impor.

Em 2021, o INEA iniciou a formação do Conselho Deliberativo da RDS do Aventureiro e a SAPÊ foi escolhida como uma das instituições participantes. Caberá ao Conselho fazer o gerenciamento da Unidade de Conservação, estabelecer seu Plano de Manejo e sua efetiva implantação. Mais um desafio a ser enfrentado em parceria com a comunidade.

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